Período: Dezembro/2024 | ||||||
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Por tudo que o Brasil vive, a impressão é que o país sucumbiu à corrupção. Aliás, para muitos, ela tem origem da nação, logo, é intrínseca. Não tem jeito. Como um polvo, seus tentáculos atingem a maioria das esferas públicas e privadas. No entanto, não caia na armadilha da unanimidade. Ao falar de corrupção e integridade no ambiente corporativo, Edmarson Bacelar Mota, coordenador do MBA em desenvolvimento humano de gestores da FGV/Faculdade IBS, enfatiza que não tem uma solução simples. “É um problema complexo e com várias óticas.”
Ele explica que a pressão pela corrupção está presente nos níveis mais altos, já que no nível operacional não é corriqueiro. “A maioria das empresas tem um sistema de governança forte no operacional. Portanto, ao falar de ética dentro da empresa é preciso ter cuidado para não generalizar. Acredito que o trabalhador da labuta tem um padrão de honestidade bem-adequado, pensando que nossa cultura tem certa tolerância. Agora, da tolerância para a prática já estratifica a corrupção. Esse é um primeiro olhar”, diz.
O segundo ponto para levar em consideração, de acordo com o professor da FGV, se sustenta com base nos argumentos do analista de carreira Dan Pink, que examina o quebra-cabeça da motivação. “Ele mostra que toda vez que há estímulos de motivação extrínseca, seja ameaça ou benefício (chicote e cenoura), o desempenho caiu estatisticamente. O resultado foi comprometido. Na prática, prejudica o rendimento das pessoas.” Agora, Edmarson Bacelar reforça que essa análise envolve trabalho de nível mais sofisticado, que demanda capacidade intelectual, de soluções de problemas e autoconhecimento maiores. A pressão de mentir, falsificar números, maquiar metas, entre outros. No entanto, ele alerta que a pressão não é só da empresa, mas do mercado. Sem falar que há ainda a familiar, dos cônjuges e da sociedade (aquela história de manter status, de trabalhar numa organização de grife, ter um alto cargo etc.). “O que nos leva a pensar, além da cultural, numa ótica também sociológica.”
Pressão
O professor lembra que na pressão da recompensa versus punição, muita vezes o profissional “não mente para corromper, mas para mostrar bons resultados para o gestor. Num mercado onde a competição é intensa, em que vivemos uma mudança de perfil da força de trabalho, alto índice de desemprego, oferta de empregos de menor relevância, redução salarial, é tudo bem complicado”.
Mas a grande saída, que não é a curto prazo, está no terceiro olhar interpretado por Edmarson Bacelar. “Tem a ver com educação e qualificação da pressão, de ser uma pessoa bem formada. Papel da família, da escola, do professor melhor preparado, da sociedade. Assim, cada um vai ficar mais blindado às pressões e perceberá outros valores. E, com a maturidade, virá mais sabedoria, experiência e vivência. O desafio é ter uma vida normal e manter a base. Uma sociedade que se prepara tem eixo na educação. É difícil, precisa ter firmeza e a verdade é que trabalhar muito é inevitável.”
Integridade. Honestidade. Dignidade. Honradez. Imparcialidade. Virtude. Correção. Todos esses sinônimos são características que a maioria das empresas busca no profissional na hora da contratação. São valores do trabalhador que vão ao encontro aos da empresa, e a contrapartida também faz parte do processo de seleção. A mestre em administração estratégica de negócios e presidente da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH-MG), Eliane Ramos de Vasconcellos Paes, questiona: “Vivemos no mundo 'vuca'? O uso da expressão 'vuca' remonta ao final dos anos 1990, e teve origem no vocabulário militar americano, sendo realmente usado depois do caos do 11 de setembro. É uma sigla em inglês que descreve e faz refletir sobre a volatilidade, incerteza, complexidade e ambiguidade das condições e situações atuais”. Será que vivemos no mundo dos antiéticos? “A palavra ética deriva do grego ethos, ou seja, o modo de ser de uma pessoa. Aliás, cada um de nós deve se perguntar: Eu quero? Eu posso? Eu devo?. Em um cenário marcado pela diversidade das crises – de liderança, de generosidade, de amizade, de transparência, de falta de tempo, de dificuldade de encontrar líderes que inspirem seus liderados. Sabemos que, para que os colaboradores se sintam realizados e felizes, é preciso que participem de uma empresa ética, na qual a cultura e os valores façam sentido para as pessoas e possam ser compartilhados, aprendidos e vividos”, explica Eliane Ramos. Segundo ela, a empresa que adota o princípio inegociável do 'não fazemos qualquer negócio' reflete em sua cultura a força dos líderes imprescindíveis para os novos tempos, daqueles que rejeitam e abominam comportamentos antiéticos.
Umbigo
Quem de nós não se sente realizado e orgulhoso de fazer parte de um time ético e com propósitos bem definidos? Eliane Ramos enfatiza que precisamos de líderes que nos inspirem, que tenham uma comunicação assertiva, que saibam se conectar com as pessoas e fazer acontecer, que nos ensinem pelo melhor exemplo. “Chega de falar e nada realizar. Basta de pessoas egoístas, que só olham para o seu próprio umbigo e desperdiçam o nosso precioso tempo maquinando ações reprováveis moral e até legalmente para se dar bem valendo-se viciosamente do 'eu quero, eu posso'.” A presidente da ABRH-MG chama a atenção para uma nova realidade que se impõe avassaladoramente. “São dias do 'grande poder requer grande responsabilidade'. A ética condenou o mundo 'vuca'. Queremos viver – gerações X, Y, Z, Flux – juntos. Precisamos de mentalidades que convivam com a instabilidade, saibam se reinventar na carreira, se adaptem às mudanças aceleradas, sejam arrojadas na revisão de modelos de negócios e que saibam conviver com as incertezas. Se não temos como retroagir neste mundo 'vuca', precisamos seguir em frente sem abrir mão da coerência, da dignidade, do respeito e da ética nas relações empresariais e sociais. Isto sim, deve permanecer imutável em nós.”
“Essa questão não é só brasileira e nem só das empresas com fins lucrativos. Veja o que ocorreu no Vaticano e que foi destacado recentemente, por exemplo. As empresas estão investindo na criação de cultura de valores éticos e morais. As áreas de compliance estão se fortalecendo. E estão, cada vez, mais no centro da atuação dos CEOS e de conselhos. Quanto à pressão de superiores, como lidar e qual atitude tomar não há uma resposta fácil para essa situação. Porém, a decisão não está em perder ou não o emprego apenas, mas em sofrer consequências mais complicadas. Veja o caso de executivos que aceitaram aderir a práticas fraudulentas. Estão sofrendo as restrições da lei e provavelmente não encontrarão emprego. Além disso, muitas empresas presentes nas investigações da Lava-Jato estão perdendo clientes em função disso. E é importante enfatizar que o ser humano habita vários lugares durante a sua vida. Ser ético é uma escolha pessoal. Existe corrupção em todas as áreas. Pessoas que geram vantagem em troca de alguma coisa são corruptas. Líderes que contratam uma pessoa por interesse pessoal, mesmo que ela não tenha o perfil adequado, estão agindo fora da ética. Ter talento, estudar e treinar são deveres de quem quer ser um profissional valorizado em sua área de atuação. Os comportamentos de uma pessoa em uma organização dependem de suas características individuais e de como isso impacta na organização. Há empresas que permitem líderes que agridem verbalmente seus colaboradores. Porém, se meus valores não permitem esse tipo de postura não vou gritar com ninguém. Manter uma postura ética é um valor pessoal que deve ser aplicado também dentro de uma organização. A corrupção sempre existiu, no Brasil e no mundo. Não sei por que tanta estranheza nos últimos tempos com relação a esse tema. Estranho e inusitado é que as pessoas envolvidas em corrupção estão sendo punidas recentemente, o que quase nunca ocorreu.”
Teste de integridade
As empresas já se preparam para analisar não apenas a competência técnica e intelectual de profissionais, mas a capacidade de resistência a pressões quando expostos a situações de conflitos e dilemas éticos. A S2 Consultoria, especializada em prevenir e tratar atos de fraude e assédio nas organizações, oferece ao mercado uma ferramenta de gestão e de desenvolvimento humano que analisa a postura ética de candidatos, funcionários e até mesmo fornecedores. É o chamado Potencial de Integridade Resiliente (PIR).
Renato Santos, sócio da S2, explica que, no PIR, uma vez identificada divergência entre a integridade individual apresentada e a esperada pela organização, a plataforma tecnológica contribui com o desenvolvimento para diminuição do gap apresentado por meio de programa de treinamento interativo, discutindo e analisando casos próximos da realidade do profissional, possibilitando a sua vivência de forma prática e direta. “Ele tem o mesmo valor preditivo (67%) de testes de personalidade e é aplicado a qualquer realidade organizacional, independentemente do tamanho da empresa ou de seu ramo de atuação.”
Podemos pensar que a aplicação desse teste é que somos de uma nação em que todos são corruptos e corruptores? Para Renato Santos, não. “Aliás, a maioria das pessoas não é corrupta, o que é bem alentador nos tempos que estamos vivendo no Brasil. Mas, por outro lado, todos nós somos potenciais corruptos quando consideramos a pressão que sofremos e a racionalização que desenvolvemos ao longo da vida dependendo da cultura em que estivermos inseridos. Dois exemplos: imagine que você é gerente de um banco e assaltantes sequestram seu filho fazendo a exigência de entrega da senha de acesso ao cofre. O que você faria? Concorda que é um tipo de pressão grande que pode levá-lo à corrupção? Lógico que em um exemplo superlativo desse fica mais evidente. Talvez distante da realidade da maioria dos que nos leem, mas a pressão também ocorre quando um chefe pede para manipular números falsos para maximizar seu bônus. Esse exemplo já é bem mais próximo do dia a dia da maioria.”
Assim, para evitar a corrupção no ambiente de trabalho, Renato Santos afirma que é necessário mudar o ambiente e não apenas ‘demonizar’ o corrupto. Isso não significa que ele não deva ser punido, deve. “Mas é necessário entender os ativadores de comportamento que levaram a pessoa a se tornar um corrupto, já que muitas vezes ele se corrompe por pressões da própria organização. Como quando a empresa diz: ‘Não quero saber como você vai atingir a meta, apenas traga resultados!’.”
Diferenças
Renato Santos explica que a ética e a integridade no ambiente profissional é diferente do comportamento fora da organização. “Uma pessoa que paga propina para um agente público em nome da empresa não necessariamente paga propina para o guarda de trânsito quando é parado com sua família na estrada, por se sentir constrangido diante dos filhos. Ou ainda, uma pessoa que instala software pirata em seu computador pessoal não necessariamente colocaria no computador da empresa, se acreditar que pode perder o emprego com essa ação. Existem pessoas que agem sob princípios e para elas o seu comportamento será o mesmo, dentro ou fora da organização. Mas a maioria das pessoas age sob pressão, o que significa que o contexto que estiver vivendo influenciará muito seu comportamento.”
Para Renato Santos, é possível mudar a postura ética. “O senso comum diz que ‘ética se aprende no berço e não depois’ e que ‘pau que nasce torto não se endireita’. Se partirmos dessas premissas teremos que afirmar que o ser humano é um ser acabado, que não muda depois de adulto. Mas você é a mesma pessoa do que era 10 anos atrás? Melhor ou pior, você não é a mesma pessoa. Logo, é possível mudar. Entretanto, é preciso querer. Quando aplicamos esses conceitos nas organizações comprovamos estatisticamente (e publicamos no livro Compliance mitigando fraudes corporativas) que as empresas podem mudar a postura ética com um programa integrado de compliance”, ressalta.
Renato Santos esclarece que o PIR aborda uma “integridade inteligente” a qual não impõe que os interesses pessoais sejam coibidos completamente, mas que eles sejam mitigados conforme as circunstâncias concretas de uma maneira pragmática e realista. “Discutindo e apresentando as vantagens em se manter a integridade, não apenas para a coletividade a qual faz parte, mas também, e principalmente, para seu próprio interesse. Essa abordagem não é apenas mais realista, mas mais humana, uma vez que considera e respeita as necessidades do homem.” Ele destaca qual a expectativa que as empresas têm ao adotar a ferramenta. “Diminuir casos de fraudes e assédios. E o PIR atende a essa expectativa, uma vez que identifica potenciais ativadores de comportamento e desenvolve nos profissionais uma resiliência adequada para lidar com dilemas éticos no seu dia a dia profissional. Mais do que ser um programa “pega ladrão” ou “caça bruxas”, o PIR tem o propósito de mitigar riscos humanos, que, na maioria das vezes, nem mesmo a pessoa tinha percebido que está exposta.”
Diante dos resultados do PIR (para adquiri-lo, basta acessar www.s2consultoria.com.br e solicitar uma demonstração gratuitamente) é possível que o empregador mude o comportamento do empregado. “Na maioria dos casos, a organização prefere desenvolver o comportamento do empregado ou do candidato que é muito bom tecnicamente. O PIR aponta em seu relatório os recursos necessários para esse desenvolvimento.” Vale dizer que o PIR foi desenvolvido em uma plataforma web, o que possibilita sua aplicação em qualquer lugar. “A aplicação da plataforma leva a uma reflexão: se uma empresa grande sofre uma fraude, ela sofre um impacto, mas habitualmente sobrevive. Já uma empresa pequena ou média, dependendo da fraude pode levá-la à falência”, diz.
Bons exemplos
Na última quarta-feira, o Ethisphere Institute, líder global na definição e no avanço dos padrões de práticas de negócios éticas que alimentam o caráter corporativo, a confiança no mercado e o sucesso dos negócios, anunciou, em Nova York, novas empresas e líderes que receberam essa distinção durante o 9º Annual Global Ethics Summit. Entre os nomeados, David Howard (vice-presidente corporativo e vice-diretor geral da Microsoft), James Gibson (do Conselho Global de Compliance da Coca-Cola), Thomas Kendris (presidente da Novartis), Emmanuel Lulin (vice-presidente sênior e diretor de ética da L’Oréal) e Jeffrey Eglash (vice-presidente de ética e conformidade da Nokia).
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Atualizado em: 25/12/2024 10:51 |